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Quando você está usando o computador ou videogame e, de repente, a energia cai, todos os arquivos ou jogos abertos são reiniciados a partir do estado em que foram salvos pela última vez, o que nos faz perder grande parte do que já tinha sido feito.
O que promete a nova tecnologia?
Esse tipo de perda certamente não ocorrerá quando começarmos a usar máquinas feitas com memristores, ou seja, com memória resistiva (ReRAM). Isso porque, com os memristores, não haverá a divisão das informações dos eletrônicos em unidade de armazenamento (que não depende de energia) e memória volátil (instantânea) (que apaga com o aparelho desligado).
Uma nova maneira de fabricar memórias como essas foi criada por cientistas da USP e teve o pedido de registro aceito pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial) em novembro de 2022. Marina Sparvoli, pós-doutoranda do Instituto de Física (IF) da USP, em colaboração com outros pesquisadores, desenvolveu um mecanismo de memória baseado nos memristores, a partir de materiais jamais combinados.
O protótipo consiste em uma camada de grafeno depositada entre contatos de indium tin oxynitride (Iton) — semicondutor pouco pesquisado — e de alumínio, como um sanduíche. A eletricidade passa pelo conjunto, gerando campo eletromagnético. Dependendo da tensão, forma-se ou não um filamento responsável pelo fenômeno de comutação resistiva, de alta e baixa resistência.
A grande vantagem dessa tecnologia é que, ao contrário das memórias atuais, as informações contidas nas memórias resistivas não somem quando o aparelho é desligado. Ainda não existem computadores equipados com tal dispositivo, por isso os testes são feitos em estações de prova de semicondutores (probe station).
Quando ligamos um PC, o Sistema Operacional (Windows, MAC OS ou Linux, por exemplo) é copiado do dispositivo de armazenamento de dados (que podem ser HDs ou unidades de memória do tipo Flash, chamadas de SSDs). Os HDs são, grosso modo, discos magnéticos que vêm sendo substituídos por SSDs nos últimos anos. Os SSDs são menores e muito mais rápidos – o que tem permitido o surgimento de computadores mais leves e finos. No caso dos Smartphones, sempre foram usadas memórias do tipo Flash para o armazenamento.
Agora, essa tecnologia pode se tornar obsoleta, a partir da criação da pesquisador da USP: os chips propostos por ela são até 100 vezes mais rápidos que as memórias do tipo Flash. Além disso, como estamos falando de uma tecnologia que é capaz de preservar os dados mesmo quando os aparelhos estão desligados, o processo de cópia dos arquivos de um HD ou de um SSD para um chip de memória RAM por exemplo, seria dispensado: tudo já estaria resolvido com o uso das memórias ReRAM. Além disso, os memristores são minúsculos, compreendendo algumas poucas centenas de átomos de espessura, e podem se comportar como conexões neurais biológicas.
Esse novo tipo de memória trabalha com estados de resistência alta e baixa à passagem de corrente elétrica. Ou seja, no momento em que há resistência alta à passagem da corrente pode representar o número 0, no momento em que há resistência baixa, isso pode representar o número 1, por exemplo. A alternância entre 0 e 1 é que corresponde ao código binário da linguagem dos computadores. Nos chips atuais, essa alternância é determinada pela tensão (há a passagem de corrente ou não) — e não pela resistência baixa ou alta da nova tecnologia.
Os filamentos de memristores podem ser construídos na escala dos nanômetros, ou seja, de milionésimos de milímetro (0,000.000.001 metro), prometendo infinidade de informações salvas em minúsculo espaço de armazenamento.
A computação resistiva ainda não é utilizada em aparelhos comerciais. Embora alguns componentes já sejam vendidos separados, eles têm os cientistas como público-alvo. Em relação à tecnologia hoje utilizada nos PCs domésticos, de metal-óxido-semicondutor complementar (CMOS), ela é mais compactável e não está limitada pelos gargalos de processamento em série. Ou seja, podem enviar dados simultâneos ao invés de formar filas durante as transmissões nas linhas de comunicação internas.
Os arquivos salvos também ficariam muito menos suscetíveis a serem apagados acidentalmente. Para destruir a informação armazenada nesse novo tipo de memória, precisa ser aplicada forma muito específica de campo magnético que não existe na natureza. Para efeito de comparação, os dados contidos em unidades de armazenamento comuns podem ser destruídos apenas passando um ímã por perto.
O professor José Fernando Chubaci, que supervisiona Marina no pós-doutorado, conta que a aplicação de Iton a memórias resistivas nunca foi feita antes.
Esse é um projeto na fronteira do conhecimento mundial, que terá aplicação no mercado internacional daqui a dez, 15 ou 20 anos. A doutora Marina conseguiu criar memórias resistivas usando grafeno com o Iton, ampliando espaço de pesquisa na área e trazendo conhecimento ao nosso laboratório.
José Fernando Chubaci, professor do Instituto de Física da USP
Marina explica que o Iton é a variação do óxido de índio e estanho (ITO), este último usado no touchscreen, como telas de celulares. “A inovação está em usá-lo com o nitrogênio.” O grafeno, por sua vez, é forma cristalina plana baseada no carbono, um dos elementos mais abundantes no planeta.
Esse cristal é formado por única camada de átomos. Mesmo sendo ultrafino, é extremamente forte e tem uma das melhores propriedades eletrônicas entre todos os materiais existentes.
As investigações de Marina com memristores começaram em 2016. Ela apresentou o invento em diversos encontros, com destaque para a Conferência Mundial de Carbono no Imperial College of Science de Londres, Inglaterra, em julho de 2022. A próxima etapa será testar a influência da luz na memória construída com esse material.
IMAGEM DESTACADA – FOTO: MARCOS SANTOS / IMAGENS USP